domingo, 17 de março de 2013

Crostata da Argia


Esta receita eu encontrei num livro de receitas que a Lígia Negri me deu no Natal de 2008. É um livro muito bonito, não tem receita de chefe, tem receita de cozinheira. Aquelas coisas simples que quem gosta de cozinhar faz com o maior prazer. O livro foi escrito por Miriam M. Guerrieri, uma descendente de italianos que mora em Salto, no interior de São Paulo. Miriam no livro chamado Conversas com Sabor ou Chiacchierate con sapore (a edição é bilingue) apresenta a cozinha de sua mãe Argia, com quem aprendeu cozinhar e conta histórias da família de forma poética e amorosa, com o sabor da velha cozinha. Aquela cozinha onde um prato de macarrão é um prato cheio de alegrias e histórias de quem está de bem com a vida, porque o bem comer e o bem viver andam sempre juntos. Antes que eu esqueça se alguém estiver interessado só nas receitas não vai entender porque Miriam às vezes põem receitas muito simples. Aliás, todas são recitas muito simples, mas se transformam em comidas que a gente saboreia antes mesmo de faze-las pelas histórias que cada uma delas contem.

Ingredientes

1 ovo inteiro e 1 gema
2 xícaras de  chá de farinha de trigo
1/2 xícara de chá de açúcar 
1/2 colher de raspa de casca de limão
1/2 xícara de chá de manteiga
1 colher de sopa de leite

Misture todos  ingredientes em uma tigela  e amasse até formar uma massa lisa e homogênea; abra a massa sobre uma superfície enfarinhada e coloque numa forma untada até metade da beirada. Reserve parte da massa para cobrir a torta em rede.

Recheio 

40 gramas de avelã (se quiser pode colocar mais)
40 gramas de amêndoa (se quiser pode colocar mais)
1/2 xícara de damasco picado (se quiser pode colocar mais)
1/2 xícara de geléia de framboesa (eu fiz com geléia de frutas vermelhas).(Se quiser pode colocar mais)
1/2 xícara de geléia de pêssego ou laranja (se quiser pode colocar mais)
1 maçã (se quiser pode colocar mais)

Quebre as amêndoas e a avelãs grosseiramente e reserve. Pique os damascos e a maçã em pedaço pequenos. Misture as geléias e espalhe sobre a  massa fazendo uma camada grossa. Espalhe a maçã e o damasco sobre a geléia. Salpique as amêndoas e a avelã. Com a parte da massa que você reservou faça tiras e disponha em forma de rede sobre a torta. Asse em fogo médio. Depois de assada espalhe acúcar de confeiteiro sobre a massa.

A Miriam  chama esta torta de Crostata de Frutas, eu preferi homenageá-la chamando de Crostata da Argia. Espero que se a Miriam um dia encontrar meu blog não fique braba comigo. Outra coisa, a receita da Miriam é o dobro dessa, mas estas proporções aqui rendem uma crostata de bom tamanho, dá para uma 8 pessoas, com folga. Obrigado Miriam por esta receita maravilhosa. Não repare meu acabamento em rede, sou péssimo nestas artes. Viva Argia que nos deixou essa receita maravilhosa e que Miriam generosamente compartilha, coisa de cozinheira que se sente feliz dividindo com os outros sua boa comida. 


sexta-feira, 15 de março de 2013

Codorna com Molho de Funghi



Quando era menino no interior do Rio Grande do Sul era muito comum entre os italianos as passarinhadas. Naquela época, antes dos agrotóxicos acabarem com os bichos, havia muito passarinho e caçar era uma forma de não deixar que a super-populção acabasse com as lavouras de trigo, milho e arroz. Na época de caça se realizavam as caçadas com dia e hora marcada para juntar depois as famílias numa grande passarinhada. Comíamos sem culpa por ter matado os bichinhos. Ou  matávamos os passarinhos ou não teríamos o milho, o trigo e arroz  para comer durante o ano.  Naquela época não éramos politicamente corretos, mas éramos civilizados, respeitávamos os ciclos da natureza. Matávamos os bichos na época certa e na quantidade exata para uma boa festa. 
Lembro muito dessas passarinhadas que aconteciam à noite depois da caçada. Os homens caçavam e as mulheres limpavam os bichos e preparavam um grande jantar. As pombas, codornas e perdizes eram as preferidas. E a passarinhada era uma beleza. Os bichinhos preparados num maravilhoso molho com vinho branco, sem tomate  e muita erva.  Não podia faltar sálvia e rosmarim (alecrim numa variação mais azulada, mais tenra, parecida com a folha da lavanda). Vinho tinto, polenta ou macarrão e uma salada de radichio da horta eram os acompanhamentos. Depois os cantos dos imigrantes como Santa Lucia, Oh!  Sole Mio e muita ária de ópera, das quais as mais famosas eram  as do Rigoleto e da Traviata. As mulheres não chiavam, se fosse seria um Deus nos acuda!
Meu irmão Angelo recebeu o apelido de Codorna, porque era um exímio caçador. Morreu  há quase dois anos, e muitos amigos não deviam saber o nome que recebeu no batismo. Como no conto de Guimarães Rosa, Meu  Tio o Yuaretê, que o sujeito quer desonçar o mundo, meu irmão nasceu para descodornizar as roças. Sua cabeça não ia pra além da pequena vila e seu entorno. Sempre tinha um cachorro perdigueiro, daqueles que aparecem nas pinturas, principalmente as Inglesas que exibem cenas cotidianas, as famosas Coversation Pieces. Nestas as caçadas são frequentes. O cachorro sempre o acompanhava  nas caçadas e além do cachorro, a espingarda, claro. Pois bem esta receita é uma releitura dessa memória  passarinheira, que adaptei às condições atuais com codornas de super-mercado e funghi sechi para ficar mais chique (kkkkkk). Boa mesma era aquela passarinhada que nunca mais vou comer, porque tinha um monte de história de caçadores, de afetos e de sons desafinados mas alegres e de grandes risadas vindas de bocas lambuzadas de molho.

Ingredientes

1 codorna inteira por pessoa
Vinho Branco seco
2 colheres de sopa de azeite de oliva
Sal
Pimenta do Reino
Alho
1 cenoura 
Folhas de Sálvia, salsa, cebolinha e louro
1 Ramo de alecrim
Azeite de oliva
Funghi seco
1 fatia de pimentão vermelho sem pele.
(não saberia precisar a porção exata de cada engrediente, calcule em função da quantidade de codornas que for fazer).

Marinando as codornas

De véspera limpe as codornas e coloque numa tigela com com o vinho branco e um pouco de água, o azeite, o alho, a pimenta em grãos, a cenoura cortada, as folhas de sálvia, cebolinha, salas, alecrim e o louro. As codornas devem ficar cobertas com o líquido de vinho e água (mais vinho que água). 

Fazendo sua passarinhada


Retire as codornas da marinada e reserve o líquido com todos os temperos. Numa panela de fundo grosso coloque um pouco de azeite e doure as codornas. Quando estiverem douradas jogue sobre elas o sal e o conteúdo da marinada e a tira de pimentão picada. Só coloque o sal agora para os bichinhos não desidratarem e ficarem secos.  Enquanto as codornas fervem hidrate o funghi com água quente. Pique o funghi bem fino e jogue na panela com das codornas e a'gua em que foram hidratados. Deixe ferver mais um tempo, se necessário acrescente mais água. Depois do funghi cozido vá apurando o molho. Ele vai engrossar e ficar bem escuro. Prove o sal, se precisar acrescente um pouco mais. Sirva as codornas quentes regadas com este molho maravilhoso e que não dá trabalho nenhum. 
Você pode fazer como acompanhamento um macarrão que será temperado com parte do molho, mas eu prefiro polenta. Tem uma polenta instantânea da Stival, que você faz rapidinho e fica ótima. Escolha a tradicional, as outras não prestam, tem sabor disso e daquilo, mas são horríveis. Agora se você estiver a fim o bom mesmo é a polenta de fubá, que você fica um tempão mexendo.
Na foto a codorna está acompanhada com polenta e salada de chicória. Vejam que deixei a folha inteira de propósito, como se fazia nas passarinhadas da minha infância.  
Esta receita é para minha sobrinha Fátima Rasia, filha do meu irmão que descodornizava as lavouras pelo menos uma vez por ano! Ela não viveu esse tempo, mas a mãe dela sabe que estou falando.